terça-feira, 2 de agosto de 2016

Conscientização: Fundamento da Democracia

            Nem sempre as imagens comunicam a verdadeira face das pessoas e seus reais objetivos. Muito facilmente nos deixamos envolver por imagens sentimentalmente embelezadas, como se a realidade não tivesse obscuridades.
            Por exemplo: o governo interino do País utiliza a imagem da Bandeira Nacional com o lema “Ordem e Progresso”, como plataforma ideológica de defender decisões liberais, na tentativa de conservar e aperfeiçoar aquilo que existe de bom, a “Ordem”, através da correção e eliminação do que é ruim, para se alcançar o “Progresso”.
            Sim, até governo interino tem ideologia; e, a desse é defender a doutrina religiosa positivista: a busca e a manutenção de condições sociais básicas – “respeito aos seres humanos, salários dignos e o melhoramento material, intelectual e moral” da Nação -, conforme a definição do referido lema no portal Wikipédia, que o próprio governo tem se utilizado e processado alterações na defesa de seus interesses. Entretanto, as suas propostas e decisões têm mostrado a direção contrária a estes conceitos. A hipocrisia, como manifestação da perversão, se desmascara.
            Neste contexto, nossos olhares precisam refletir sobre os acontecimentos históricos, remotos e contemporâneos, que marcam a nossa democracia. A justificativa para esse exercício está além de uma mera oposição ao governo interino e seus planos, mas, trata-se de, séria e verdadeiramente, procurarmos relacionar o desenvolvimento político com o nosso desenvolvimento psicológico pessoal com a democracia.
            Esse desenvolvimento não é alcançado se permanecermos em nossas “zonas de conforto”. É preciso um envolvimento pessoal com os conteúdos do inconsciente cultural brasileiro que tocam às fragilidades do nosso processo democrático.
            Não podemos encobrir com subterfúgios as tragédias político-sociais e econômicas experimentadas pela sociedade brasileira. Antes, temos de exigir de nós mesmos um envolvimento profundo com as condições deste momento, assumindo nossas sombras pessoais e enfrentar os fatores políticos do processo em curso, do contrário, as nossas estruturas psicológicas e sociais sofrerão fortes abalos. A conscientização política e psicológica é o fundamento da vida democrática de um povo.
            Temos de entrar em acordo, depressa, com a nossa memória histórica. Quando o tempo passado se ausenta, o presente é romantizado. O apagamento e desapego da história enganam com uma aparente inofensiva inocência.
            Portanto, o desenvolvimento político passa por um desenvolvimento psicológico quando nos relacionamos com os fatores inconscientes que nos levam a um distanciamento dos processos históricos da nossa democracia. O processo democrático real depende da relação política com as nossas zonas externas e internas, do mundo real e do reino interior, da relação consciência e inconsciente.
            A Bandeira Brasileira tem mais do que “Ordem e Progresso” – empobrecemos o processo político interno e externo se nos identificarmos com isto, apenas. Temos de ir além da beleza sentimental da imagem verde e amarela.
            “Aquilo a que damos o nome de civilização, [...] tem uma outra face, a de uma ave de rapina cruelmente tensa, espreitando a próxima vítima, face digna de uma raça de larápios e de piratas. Todas a águias e outros animais rapaces que ornam nossos escudos heráldicos me parecem os representantes psicológicos apropriados de nossa verdadeira natureza”, afirma C. G. Jung (Memórias, sonhos, reflexões. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015, p. 250).

(Sílvio Lopes Peres – Psic. Clínico – CRP 06/109971 – Candidato a Analista pela Associação Junguiana do Brasil (AJB/Campinas), filiada à IAAP – International Association for Analytical Psychology (Zurique/Suíça) - Fones: (14) 99805.1090 / (14) 98137.8535)