sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Pai e filha

            Em tempos de misoginia – ódio, desprezo e repulsa ao gênero feminino e às características a ele associadas -, violência doméstica e nas ruas, cumprir com as exigências culturais e econômicas como trabalhar fora, educar os filhos, cuidar da casa, atender aos padrões de beleza e da moda, competir no mercado de trabalho, tem se mostrado um grande desafio para a grande maioria das mulheres.
            Neste contexto, o pai desempenha um papel crucial na vida das filhas, independente da faixa etária, se quiser exercer uma paternidade suficientemente boa.
            O pai é a pessoa que pode comunicar à filha, com segurança, que ela pode ser mulher num mundo que exige muito dela, sem que despreze sua feminilidade.
            É ele que favorece a ideia de que ela pode, inclusive, ser mãe, isto é, dá acesso aos vários caminhos que estão disponíveis em nossa cultura, para que ela escolha, decida e continue a ser quem ela é, que desenvolva e explore, como mulher, seu pleno potencial, sua identidade pessoal, sua vocação, seu lado assertivo e agressivo, sua expressão sexual, seu caminho espiritual.
            “O resultado da luta de uma mulher para sentir-se psicológica e socialmente inteira e integrada, e ao mesmo tempo ser psicológica e socialmente diversificada é, em grande medida, moldado pelo relacionamento pai-filha”, afirma o analista junguiano Andrew Samuels, em “A psique política” (Rio de Janeiro: Imago, 1995, p. 179).
            As filhas esperam que seus pais sejam homens não aliados aos padrões restritivos colocados sobre as mulheres, mas sim, alguém para quem existem muitas perspectivas e modos de ser mulher.
            É importante que o relacionamento pai-filha seja travado numa energia psicológica que ela viva coerentemente com seus próprios sentimentos, impulsos, fantasias e instintos, sem a famigerada culpa da “supermulher” e “supermãe” conforme os padrões veiculados pelos meios de comunicação dirigidos ao público feminino.
            O relacionamento pai-filha atua como pano de fundo e pode ser suficiente ou insuficiente, quer dizer, proporcionar satisfação ou insatisfação à vida da mulher.
            Não são poucas as mulheres que tentam manter sua agressão fora de seu casamento e sob controle no trabalho, mas são consumidas pelo medo de que podem explodir num “ataque de nervos”, por que seus pais reprimem, não aprovam, e/ou não sabem lidar com a agressividade delas.
            Sentimentos, impulsos, fantasias e instintos nos caracterizam como seres humanos, e as mulheres têm direito de expressá-los. E, os pais exercem um crucial papel nisso, no sentido de ajudar as filhas a lidarem com isto sem culpa, ao contrário, valorizar-se e integrar os fatores inconscientes ao modo de ser mulher.
            Os efeitos de um pai emocional ou fisicamente ausente/distante podem ser profundos para a filha: sentir-se desvalidada pelos homens, até pelos filhos que venha a ter ou já têm; achar que não possui nenhum poder de sedução e ser deixada pelo/a companheiro/a; ter pouca confiança em si mesma, em suas capacidades de trabalho principalmente se trabalha com homens menos capazes do que ela.
            Reflita sobre isso, se você é pai de uma mulher. Feliz Dia dos Pais!

(Sílvio Lopes Peres – Psic. Clínico – CRP 06/109971 – Candidato a Analista pela Associação Junguiana do Brasil (AJB/Campinas), filiada à IAAP – International Association for Analytical Psychology (Zurique/Suíça) - Fones: (14) 99805.1090 / (14) 98137.8535)