Nossa identificação com os
animais é mais próxima do que pensamos. Isto pode ser observado, por exemplo, ao
empregarmos algumas expressões: “filho de peixe, peixinho é”, “este tem sangue de
barata”, “lágrimas de crocodilo”, etc. Não
é difícil imaginar-nos como animais. É como se tivéssemos os mesmos instintos.
Os animais fornecem a base dos
nossos traços comportamentais: a agressividade de um cão; a feminilidade de uma
gata; o ludibrio do macaco; a moleza da preguiça; a camuflagem do camaleão; a
força do touro; a astúcia da raposa; a rapinagem do gavião; o veneno e/ou o
curativo da cobra; o arroubo dos pássaros; a ligeireza do jumento -
imortalizada na “Apologia do jumento”, de Luiz Gonzaga; etc.
As Sagradas
Escrituras nos lembram: “Eu estou enviando vocês como ovelhas entre lobos.
Sejam cautelosos como as serpentes e inofensivos como as pombas. Mas, cuidado!”
(Evangelho de Mateus 10:16). Que bicho você tem? Somos todos!
Imaginamos
e nos comportamos como ovelhas, lobos, serpentes, pombas. O mais significativo
é que olhemos para nós e percebamos as nossas afinidades com os animais, isto
é, se quisermos preservar-nos da extinção.
Combinar
a prudência com a simplicidade pode significar a diferença entre a derrota e a
vitória, a morte e a sobrevivência. Ser, ao mesmo tempo, astuto, cauteloso e
sagaz, inofensivo, singelo e cândido é um dos pares de opostos que mais nos
desafiam.
“Os
animais poderiam fazer-nos conscientes de nós mesmos”, afirma James Hillman
(Animais de sonho). Do cume da cadeia psicológica e moral, os animais nos alimentam
com os ensinamentos de como podemos ser humanos.
Para
ficarmos apenas com o “bestiário” evangélico: ovelha é seguidora, diz respeito
ao nosso instinto de rebanho; aponta para uma fantasia paradisíaca “as ovelhas
morarão junto dos lobos” (Isaías 11.6). Seria isto que explica a nossa pacata
resignação em aceitar a decretação do fim de nossos direitos e seguirmos,
calados, ao matadouro da liberdade e da cidadania?
O lobo é
dono de uma determinação fria e inflexível, graças à sua raiva oculta; trapaceador
- no conto “Chapeuzinho Vermelho”, foi capaz de se camuflar na vovó, sendo
assim, o feminino devorador e obscuro; vorazmente faminto, sua inteligência
pode levá-lo à morte; ressentido por não possuir tudo que quer, ataca a todos
que cruza os seus caminhos, mesmo sabendo que pode perder até aquilo que tem,
por julgar-se esperto e malandro. Do lobo, se formos determinados como ele,
podemos fazer valer a inteligência estratégica e prevalecer os valores corretos
sobre o mal de outros lobos.
A pomba
vagueia por todo e qualquer lugar, bastando ter alimento disponível; sua
natureza-pássaro a caracteriza pela volatilidade do voo; símbolo do espírito do
bem, da gentileza e do Espírito Santo. Assim, a pomba revela instabilidade,
ainda que identificada como “do bem”; é bom lembrar que logo após “descer”
sobre Jesus, em seu batismo, o conduziu ao “deserto para ser tentado” (Mateus
3:16-4:1). Deixar-se levar pelo “bem”, pode significar inconstância e desprezo
pelo que já foi conquistado.
A
serpente possui vastas referências a sabedoria, porém, muito dissimulada; dona
de uma pele elástica e que escama, revela a capacidade de renovar-se; é portadora
do elixir da cura de sua picada mortal; ela exige atenção redobrada, para não deixar-se
ser apanhado em um momento de distração. Nos conflitos humanos precisamos ser
como a cobra: avançar, criteriosamente, sobre as dificuldades, sem cansar de
ser forte.
(Sílvio
Lopes Peres – Psic. Clínico – CRP 06/109971 – Candidato a
Analista pelo Instituto de Psicologia Analítica de Campinas (IPAC), membro da
Associação Junguiana do Brasil (AJB), ambos filiados à IAAP – International
Association for Analytical Psychology (Zurique/Suíça) - Fones: (14) 99805.1090 / (14) 98137.8535).